Ao falarmos de crise, o primeiro passo que devemos dar é o Issue Management. Ele tem como função mapear todos os riscos da organização, toda a comunicação utilizada, todos os públicos envolvidos e tudo que há em torno dela e que pode vir a gerar uma crise. O trabalho desenvolvido deve ser rigoroso e não deve-se esconder nada. São desses problemas que conseguimos detectar as soluções.
Quando falamos sobre o planejamento estratégico em Relações Institucionais e Governamentais (RIG) o processo de issues management é uma ferramenta facilitadora para o gerenciamento dos diversos temas que ocorrem no ambiente externo e que impactam as organizações.
Nesta nova série de artigos, Andréa Gozetto* aborda o tema issues management, apresenta as definições, explica os processos e traz dicas aplicáveis ao contexto do dia-a-dia de RIG. Acompanhe!
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Em artigo anterior** afirmei que para que RIG possa realmente gerar valor, a sua estratégia deve estar alinhada à estratégia de negócios da organização, haja vista, ser RIG uma área de suporte.
Essa estratégia é formalizada em um planejamento, que normalmente se divide em três dimensões: operacional, tático e estratégico. Além de formalizar a estratégia da área, o planejamento estratégico traz clareza. Clareza sobre a situação atual enfrentada, sobre o caminho a seguir e sobre as ações que devem ser realizadas para alcançar os objetivos estratégicos definidos.
Só quem já elaborou um planejamento estratégico de RIG sabe o quão complexo ele pode se tornar. Tal complexidade é resultado da variedade de temas que impactam as organizações. Sendo assim, esses temas precisam ser devidamente gerenciados, não apenas no bojo do planejamento estratégico, mas também no dia a dia das áreas de RIG.
Para gerenciar estrategicamente os diversos temas que impactam as organizações, as áreas de RIG podem utilizar o sistema/processo de issues management.
"Ao falarmos de crise, o primeiro passo que devemos dar é o Issue Management. Ele tem como função mapear todos os riscos da organização, toda a comunicação utilizada, todos os públicos envolvidos e tudo que há em torno dela e que pode vir a gerar uma crise. O trabalho desenvolvido deve ser rigoroso e não deve-se esconder nada. São desses problemas que conseguimos detectar as soluções."
O issues management surgiu na década de 60 do século passado como uma resposta estratégica das empresas privadas norte-americanas que perceberam ser necessário monitorar e se antecipar a uma série de ameaças advindas do ambiente externo, muitas delas relacionadas a movimentação da sociedade civil em torno da defesa dos direitos civis e dos protestos antiguerra. Nesse momento da história dos E.U.A., ativistas estavam pressionando pela promulgação de leis e pelo estabelecimento de novas regulamentações que forçassem a adoção de novos padrões de governança ambiental, social e corporativa.
A ação dos ativistas se intensificou fortemente e as empresas privadas se beneficiaram dessa estratégia de gerenciamento desenhada para alertá-los antecipadamente sobre os riscos advindos do ambiente externo.
Muito associado à comunicação — era também conhecido como issue advertising, advocacy communication, single-issue advertising e controversy advertising — , o termo se consolidou apenas em meados de 1990. Com o passar das décadas, os especialistas observaram duas importantes questões. Em primeiro lugar, tratava-se de uma estratégia de gerenciamento e não apenas de um sistema de monitoramento de comunicação ou de temas e/ou problemas. Em segundo lugar, embora o monitoramento fosse extremamente importante, era preciso atender as expectativas dos críticos e comprometer-se em desenvolver ações que fomentassem a governança ambiental, social e corporativa.
Por isso, este processo passou a compor o plano estratégico de negócios das organizações. Com essa incorporação, elas passaram a ser capazes de identificar oportunidades e antecipar riscos que pudessem afetar o cumprimento de sua missão e visão.
Isso quer dizer que, com o issues management, as organizações passaram a poder reagir estrategicamente às ameaças decorrentes da arena de políticas públicas, mas, sobretudo, passaram a poder identificar e até mesmo criar oportunidades por meio de legislação, regulamentação e processos judiciais.
"É fato que, as organizações que optaram por implementar um sistema de gerenciamento de temas e questões do ambiente externo têm realizado ações proativas, que buscam identificar oportunidades e não apenas antecipar e mitigar riscos."
Para construir um sistema de issues management eficaz, eficiente e efetivo há dois pontos relevantes a avaliar. Primeiramente, é preciso aplicar de forma proativa e combinada, ao menos, quatro funções estratégicas:
Em segundo lugar, é preciso ter claro que tal sistema não é responsabilidade de apenas uma área da organização. RIG pode e deve liderar, mas não fará nada sozinha. Se não houver apoio da alta liderança e a colaboração de todos, inclusive das áreas operacionais, dificilmente o sistema contribuirá para que a organização se torne mais inteligente, ágil e visionária.
Nos próximos artigos dessa série vou discutir os principais desafios enfrentados pelos gestores de RIG na concepção e operacionalização de um sistema de issues management e, é claro, trazer dicas práticas sobre como construir um sistema integrado para gerar valor.
Até lá!
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*Andréa Gozetto é Diretora Executiva da Gozetto & Associados. Desde 2015 dedica-se a apoiar as áreas de RIG a aprimorar a sua gestão estratégica e a basear suas ações de incidência política em evidências científicas. É idealizadora do MBA em “Economia e Gestão– Relações Governamentais” e do curso de curta duração “Advocacy e Políticas Públicas: Teoria e Prática” da FGV/IDE, sendo coordenadora acadêmica em São Paulo. Possui Pós-doutorado em Administração Pública e Governo (FGV/EAESP),Doutorado em Ciências Sociais (UNICAMP), Mestrado em Sociologia Política(Unesp-Araraquara) e Bacharelado em Ciências Sociais (UFSCar). Atua como mentora de carreira em RIG, orientando e aconselhando profissionais a potencializarem seus resultados.