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Reforma da Previdência, um dia a obra acaba?

Publicado em:
21/11/2018

1) A PREVIDÊNCIA SOCIAL

A previdência social é um direito garantido pelo artigo 6º da Constituição de 1988. Ela assegura que os cidadãos brasileiros tenham acesso a uma renda paga pelo Estado em certas situações, por exemplo, no caso de aposentadoria.

A previdência está em constante debate pelos mais diversos grupos de interesse que se relacionam com o Congresso para manter ou alterar quem tem acesso a esse direito e as condicionantes necessárias para adquirir tal benefício.

O tema perpassa direta ou indiretamente um grande número de artigos e leis. No entanto, há três artigos da Constituição que estruturam os aspectos gerais da previdência. O primeiro é o art. 40, que define as regras para os servidores públicos. Além disso, a Constituição possui uma seção que trata especialmente da previdência social, pelo art. 201 que define o regime geral e o art. 202 que trata do regime complementar. Uma reforma mais profunda e permanente da previdência necessariamente precisa passar pela alteração de um desses três artigos, por meio de uma PEC. Nosso objetivo neste estudo é mapearmos todas essas mudanças.

Para se tornar uma Emenda Constitucional, a PEC precisa do voto favorável de ⅗ dos legisladores (308 deputados federais e 49 senadores) em dois turnos para cada casa. Dessa forma, aprovar a alteração do modelo da previdência mostra o imenso desafio de negociação tanto do governo bem como de toda a sociedade representada pelos grupos de interesses e profissionais de Relações Governamentais.

2) A FORMA E A CONTA DA PREVIDÊNCIA

Atualmente é possível se aposentar por tempo de contribuição ao INSS, sendo 30 anos de contribuição para mulheres e 35 anos de contribuição para homens ou se aposentar por idade, as mulheres tendo 60 anos e os homens 65 anos, ambos com no mínimo 15 anos de contribuição. Algumas funções, tais como professores, militares e trabalhadores rurais possuem especificidades.

O sistema adotado é o de repartição, ou seja, os aposentados são financiados pelos trabalhadores em atividade. Com o envelhecimento da população e a mudança na estrutura populacional, cada vez mais o número de previdenciários aumentaria, não sendo acompanhado pelo aumento proporcional no número de trabalhadores ativos.

A importância e urgência de debater sobre previdência deriva do impacto que ela exerce nas despesas de governo. Segundo a conta prevista na LOA de 2018, a arrecadação com a previdência corresponde a um valor de R$ 393,8 bi, enquanto os gastos previstos estão calculados na ordem de R$ 598,2 bi, gerando um déficit de quase R$ 200 bi.

Devido a sua importância, o tema da previdência teve destaque durante as eleições deste ano e após o resultado eleitoral, com a vitória para presidente do Bolsonaro (PSL) e a configuração do novo legislativo a partir de 2019. A questão que movimenta o Congresso neste final de legislatura é se será colocada em pauta para votação na Câmara a PEC nº287/ 2016, de autoria do governo Michel Temer (PMDB). Apresentada em dezembro de 2016, inicialmente a PEC pretendia igualar a idade de 65 anos para ambos os sexos, tendo 25 anos de contribuição no mínimo, entre outros pontos reestruturantes da previdência social, a fim de diminuir o custo para o Estado.

3) PROPOSTA DE REFORMAS

Para analisar as propostas no Congresso para a previdência buscamos no sigalei todas as PECs que alteravam explicitamente os artigos 40, 201 e 202 da CF, a partir de 1988. A cada ano, o legislativo apresenta cerca de 3 a 4 novas PECs sobre a temática. Em 2018, considerando o acumulado, são 109 iniciativas de mudança constitucional da previdência, conforme demonstra o gráfico abaixo.

A partir da entrada das PECs sobre previdência, o tema ressoou nas sessões plenárias. A previdência pautou o debate no legislativo constantemente, com picos de debates em 2003, quando teve a Emenda Constitucional 41⁄2003 e em 2017, como resultado da PEC 287/ 2016. O gráfico abaixo demonstra a quantidade de discurso dos legisladores:

Os Artigos mais modificados

O debate é constante, mas qual o interesse de alteração na constituição por parte dos legisladores?

O gráfico acima demonstra que o artigo 40 da CF/88 foi o que teve mais iniciativas de mudança por meio de PEC, indicando que a previdência do servidor público é a que mais sofre impacto. Em contraponto, o regime complementar da previdência foi o que menos teve pedidos de alteração.

Status

As PECs estão sendo pautadas, mas além de analisarmos a entrada, considerando como a mudança é proposta, é preciso também entender a lógica que completa o processo, por meio da situação atual das PECs.

O gráfico demonstra que as pautas entram no Congresso, mas a maioria delas tem como resultado ser arquivada. Chama atenção o pequeno número de PECs que foram aprovadas e viraram Emenda Constitucional. Esse dado é um indicativo da dificuldade que uma PEC tem para conseguir o voto por maioria, em duas etapas, passando pelas duas casas, exigindo um grande esforço de articulação do Congresso.

As 6 PECS aprovadas

Quando são aprovadas, o que elas modificam? Abaixo detalhamos as PECs da previdência que viraram Emendas Constitucionais. O art.40 é modificado em todas as propostas que foram aprovadas, gerando alterações nas formas pela qual a previdência é estruturada para o servidor público.

As PECs em tramitação

Enquanto isso, as que ainda não tiveram finalização, sendo aprovadas ou arquivadas, onde elas estão?

Mapeamos as 40 propostas que ainda estão em tramitação. A grande maioria está nas Comissões da Casa Iniciadora, indicando que ainda será necessário um grande esforço para que elas passem pela votação de dois turnos antes de ir para a Casa Revisora. São momentos de articulação entre parlamentares, nos quais diversos atores, como relatores e pareceristas possuem papel fundamental.

As duas PECs que estão mais avançadas são:

  • CD PEC 434/ 2014
  • Local: [Senado] Casa Revisora - Plenário
  • Dá nova redação ao inciso I do § 1º do art. 40 da Constituição Federal para assegurar proventos integrais à aposentadoria por invalidez permanente em todas as hipóteses e estabelecer a revisão dos proventos de aposentadorias por invalidez já concedidas, com efeitos financeiros a partir da data da promulgação da Emenda Constitucional.
  • SF PEC 56/ 2001
  • Local: [Câmara] Casa Revisora - Fase Comissão
  • Altera o inciso II do § 7º do art. 201 da Constituição Federal para regulamentar a aposentadoria do extrativista vegetal.

Apesar de avançadas na tramitação, caso ambas as PECs fossem aprovadas ainda assim não geram mudanças estruturais para todos os setores da previdência. A mudança a longo prazo ainda necessita de uma discussão complexa entre Executivo, Legislativo e os grupos de interesse da sociedade.

4) O FUTURO DA REFORMA

Mais que uma decisão financeira, a Previdência impacta questões culturais e sociais, colocando grandes grupos da sociedade em conflito. Por isso, alterar a Previdência demanda uma alta habilidade política e de negociação. Ao mesmo tempo, o atual modelo da Previdência está causando um grande custo aos cofres públicos demandando que o próximo governo enfrente sim ou com certeza a mudança da previdência.

Será que a PEC 287/ 2016, que faz as reformas estruturais mais profundas atualmente, ainda tem tempo hábil para ser aprovada (ou rejeitada) na mesma legislatura pela qual foi proposta? Ou a decisão ficará para a próxima Câmara, com o maior número de novos deputados, de tendências mais conservadoras de costume? Não esquecendo que mesmo se aprovada na Câmara, ainda precisará passar pelo crivo do Senado.

Ainda tem jogo para que uma proposta abrangente e estrutural da previdência se torne uma Emenda Constitucional. A necessidade de mudança está dada, mas a forma final que ela vai assumir está em aberto. Existe um longo caminho de ação para os profissionais de RelGov atuarem junto ao legislativo para definir essa questão.

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