Pontos-chave do artigo:
Neste artigo, vamos tratar da segunda fase do ciclo político, referente à formulação da política.
Esta fase corresponde ao momento que antecede a tomada de decisão sobre a política, e assume que o problema já foi reconhecido pelos atores e filtrado para inclusão da agenda. O que a fase da formulação da política pretende definir, então, são as opções viáveis de políticas para solucionar o problema. Alguns autores mencionam que essa fase envolve a pergunta “O que/qual”:
Neste sentido, a formulação de uma política deve contar com definições precisas de seus objetivos, dos elementos operacionais (instrumentos), diretrizes e arranjos institucionais. Ao final deste artigo apresentamos o desenho das políticas de saúde no Brasil e ferramentas de planejamento no Sistema Único de Saúde, a fim de promover um exemplo claro dos instrumentos da política de saúde no país.
A literatura mais recente sobre formulação política usa o conceito de desenho da política (ou policy design) para discutir que seu processo de formulação deve olhar para o passado, no sentido de entender a causalidade dos problemas, e compreender por que políticas anteriores falharam. Este processo é crucial para o desenho da política, uma vez que quanto melhor seu desenho, mais chances ela tem de ser bem sucedida na implementação.
Uma iniciativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2004 procura estimular o uso de evidências científicas, especialmente revisões sistemáticas, no desenho de opções viáveis de políticas e programas de saúde a partir do reconhecimento dos problemas. Este processo - conhecido como PIE (Políticas Informadas por Evidências) - analisa diferentes alternativas sob uma perspectiva da utilização de evidências, importante porque se vale de instrumentos robustos de análise de soluções a partir de experiências documentadas na literatura.
Esta metodologia aborda detalhes sobre os benefícios, custos, incertezas e impacto sobre grupos específicos das opções da política consideradas e incorpora elementos da implementação sob a ótica de usuários, serviços de saúde e sistema de saúde. Mais detalhes sobre este processo no Brasil podem ser consultados no website da EVIPNET Brasil (Evidence-Policy-Informed Network), uma rede coordenada pelo Departamento de Ciência e Tecnologia (Decit) da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) do Ministério da Saúde (MS) desde 2007. Clique aqui para saber mais. Esta metodologia visa traduzir o conhecimento científico para o gestor de forma palatável, para que ele possa definir alternativas à solução dos problemas e que o ajude a formular e, então, tomar uma decisão sobre a política mais adequada e com maiores chances de aceitação e implementação.
A fase da formulação é crítica no ciclo político porque o desenho de alternativas influencia a escolha política, que também expressa o poder entre forças sociais, políticas e econômicas (assunto que será tratado no próximo artigo, sobre o processo de tomada de decisão). A evidência é uma ferramenta muito útil no processo de formulação, mas ela não é a única capaz de influenciar a escolha daqueles responsáveis pela tomada de decisão. Segundo Hill (2014), a análise de uma política pública deve ser visualizada por meio do poder na sociedade, não apenas o poder para incluir tópicos na agenda governamental, mas o poder para influenciar a formulação e a implementação da política. Por isso, muito da literatura sobre a parte da formulação da política é dedicada ao entendimento do papel de grupos da sociedade neste processo.
O estágio de formulação da política é menos visível para a sociedade do que o processo de definição da agenda (que requer forte mobilização), porque ele envolve um trabalho interno com grupos de interesse, casas legislativas, comissões especiais, ou seja, entre os responsáveis por sua formulação e os especialistas no tópico.
Porém, a sociedade civil também pode demandar a construção de uma política pública e apoiar a discussão das soluções a partir de evidências robustas e de suas próprias experiências, e a exercer o controle social sobre o processo de formulação. De acordo com o próprio Ministério da Saúde “o processo de formulação deve buscar, portanto, a mais ampla e efetiva participação possível de órgãos públicos, das instituições de ensino e pesquisa, da iniciativa privada, de entidades representativas dos profissionais e da sociedade civil envolvidas com o tema” (Ministério da Saúde, 2009).
Um exemplo muito eloquente da participação de grupos da sociedade se dá pelo estudo de caso das políticas de combate ao HIV/AIDS a nível mundial, sintetizado pela linha do tempo no quadro abaixo. A referência completa pode ser vista em Buse, Mays & Walt (2012).
Confira o estudo de caso: a história da função dos grupos da sociedade civil na política global de combate ao HIV/AIDS.
Para ver o estudo, clique aqui.
O caso bem sucedido de advocacy de grupos de pacientes de AIDS impulsionou, inclusive, o ressurgimento do advocacy para doenças específicas a partir dos anos 1990, como câncer de mama e diabetes (Gilkey et al, 2008), e o fortalecimento desses grupos a partir de então, com maior profissionalização e capacitação para o trabalho de incidência política.
No próximo artigo falaremos sobre o processo de tomada de decisão, incluindo a discussão de ferramentas políticas utilizadas para operacionalizar o desenho da política. Essas ferramentas poderiam entrar também neste artigo, mas deixaremos para o próximo porque constituem parte fundamental sobre a tomada de decisão da política.
Bibliografia sugerida:
Birkland, T.A. An introduction to the policy process: theories, concepts, and models of public policy making. 3rd ed, 2011.
Buse, K.; Mays, N.; Walt, G. Making Health Policy. Second edition, Open University Press, 2012.
Fischer, F.; Miller, G.; Sidney, M.S (editors). Handbook of Public Policy Analysis: theory, politics and methods. CRC Press, 2007.
Gilkey, M.; Earp, J.; French, E. What is patient advocacy? In: Earp, J.; French, E.; Gilkey, M. (Eds). Patient Advocacy for healthcare quality, (pp. 3-28). Sudbury, MA: Jones and Bartlett, 2008.
Hill, M. (2014). Studying Public Policy: an international approach. 1st ed., Bristol University Press, Clifton, Bristol, 2014.
Knoepfel, P. et al. Public policy analysis. The Policy Press, 2007.
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