A interlocução entre público e privado é a principal habilidade das áreas de relações institucionais e governamentais (RIG). Nesta artigo, em parceria com a Equalitas Jr (UFMG), mostramos como se dão essas interações dentro da gestão pública.
A dicotomia público-privado, ao contrário do que prega a própria etimologia dos termos, tem demonstrado que essa oposição se limita ao interesse das partes, passível às mudanças conforme se emerge a transformação das dinâmicas sociais. Isso quer dizer que o pressuposto de atuação atribuída às duas esferas - isto é, o que é devido ao público e ao privado - não impede que haja convergência entre as áreas e, mais do que isso, não é impedimento de cooperação entre os dois atores, se assim se mostrar vantajoso.
A esfera pública tem por essência a busca pelo interesse coletivo, se blindando e condenando o uso do instrumento público para ganhos individuais. No campo oposto, a esfera privada se desenvolve sobre os ganhos e usufrutos privados. No entanto, ainda que sejam movidas por interesses distintos, há cooperação entre os agentes, visando sempre uma boa relação entre Estado (interesse Público Estatal), Mercado (interesse Privado) e Sociedade.
O Estado moderno capitalista sempre diferenciou os atores públicos e privados, delimitando por critérios formais e jurídicos o campo de atuação de cada um. Na esfera pública, portanto, há defesa da união social e o Estado como tutor do patrimônio público; na esfera privada, em contrapartida, se sobressaem os interesses individuais e a autonomia da personalidade privada.
A construção social e a democratização dos Estados liberais demandou a criação de burocracias e procedimentos, para que, tanto os atos públicos quanto os privados, fossem regidos e coordenados sob lisura e retidão. Aqui, surgem os Princípios da Administração Pública:
O curso da história demonstra que a aproximação entre atores públicos e privados ocorreu quase que de maneira orgânica. O Estado com suas inúmeras áreas de atuação mais as variadas demandas as quais ele tem por dever legal atender, têm usado a associação com o setor privado como um braço de atuação da Administração Pública.
A prestação direta de alguns serviços públicos pelo Estado necessita de uma boa gestão administrativa e financeira, e, a depender da natureza do empreendimento, de uma estrutura qualificada e preparada para tanto. Como em muitos casos o Setor Público não dispõe de tais recursos, a delegação do serviço à iniciativa privada apresenta-se como uma solução em relação à tradicional execução direta. Tal iniciativa é comumente usada em empreendimentos que demandam maior expertise e investimento em sua construção e operação, como grandes obras de engenharia, por exemplo. Pela Administração Pública as interações entre o público e privado visando o atendimento a demandas públicas podem acontecer em alguns formatos específicos: fundações privadas (terceiro setor), licitações, concessões, parcerias público-privadas, sociedades de economia mista e privatizações.
As entidades do Terceiro Setor, como as Organização da Sociedade Civil de Interesse Privado (OSCIPs), disciplinadas pela Lei 9.790 de 1999, e as Fundações Privadas, dispostas pela Lei n.° 13.151 de 2015, por exemplo, são pessoas jurídicas de direito privado que prestam um serviço público “não-estatal” sem fins lucrativos. São entidades comprometidas com causas sociais, sobre as quais somente a atuação do Estado não tem sido suficiente para atender a essa infinidade de setores, entre eles: ações sobre a cultura, assistência aos dependentes químicos e aos deficientes, capacitação profissional, combate à fome, cuidado aos animais, educação, preservação ambiental e saúde, dentre outros.
A Administração Pública tem por dever legal a constituição de um processo licitatório para conceder ou permitir a execução de um serviço pela iniciativa privada, seguindo sempre os princípios da Administração Pública. As duas modalidades de prestação indireta dos serviços públicos se dão através das Concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs).
As concessões, conhecidas por Concessão “comum”, são regidas pela Lei nº 8.987 de 1995, que pressupõe um contrato administrativo firmado entre a Administração Pública e a empresa privada para a execução do serviço, mediante tarifa cobrada pelo usuário ou ganhos advindos da exploração do empreendimento, já suficientes para a remuneração do prestador. Toda concessão deve satisfazer integralmente às condições adequadas para a realização dos serviços de maneira regular e eficiente.
As Parcerias Público-Privadas, regidas pela Lei 11.079 de 2004, também são firmadas por um contrato administrativo. A modalidade prevê dois arranjos: a concessão patrocinada, em que parte da remuneração do parceiro privado advém da Administração Pública e parte via tarifa paga pelos usuários dos serviços; e a modalidade de concessão administrativa, em que o pagamento integral pelo serviço é realizado pelos cofres públicos. A contratação da parceria visa celebrar a eficiência, cumprimento aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços, visando à responsabilidade fiscal, transparência e vantagens socioeconômicas para ambas as partes. No contrato de parceria deve contar as penalidades aplicáveis, forma de remuneração e reajuste, critérios de avaliação de desempenho do parceiro privado e garantias suficientes para a realização da obra e/ou serviço.
Também é perceptível essa aproximação entre o público e o privado sobre as Sociedades de Economia Mista e as Privatizações. A sociedade de economia mista possui capital público e privado, tendo o Estado como o detentor da maior parte das ações e responsável por grande parte das decisões estratégicas e administrativas para a produção de bens e/ou oferta de serviços de interesse coletivo. Já na privatização ocorre a venda ou transferência do bem público (ou de empresas estatais) para a iniciativa privada de maneira definitiva.
Esses arranjos demonstram que, embora os agentes sejam movidos por interesses distintos, é possível a cooperação entre o Público e o Privado e, mais do que isso, é uma parceria que pode render bons resultados para ambas as partes. Seguindo os princípios da Administração Pública e a capacidade de recursos do setor Privado, tais iniciativas podem melhorar a prestação de bens e serviços públicos, atrair investimentos para as esferas locais, elevar o padrão de qualidade e eficiência dos empreendimentos, possibilitando a ampliação da cobertura dos serviços. Portanto, confronta a narrativa de que a atuação do Setor Público e o Setor Privado são excludentes e contrárias e corrobora, muito mais, a ideia de que os campos de atuação podem ser colaborativos a depender dos interesses e dos mecanismos de coordenação da Administração Pública.
Neste contexto de interações público-privada, as relações institucionais e governamentais de empresas, associações e terceiro setor são essenciais para a interlocução entre as partes envolvidas em uma política pública, programa ou projeto de governo. E garantem que os diferentes interesses estejam representados.
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Esse artigo foi escrito em parceira com a Equalitas UFMG Jr, Consultoria Júnior do curso de Gestão Pública da Universidade Federal de Minas Gerais. Saiba mais sobre a Equalitas clicando aqui
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